Análise: cerebral, Botafogo comandado por Luís Castro a 1 mês resiste à pressão e cresce no segundo tempo em vitória sobre o Flamengo


Cabeça fria, coração quente. O lema é de outro técnico português, Abel Ferreira do Palmeiras. Mas cabe bem para explicar a atuação do Botafogo de Luís Castro na vitória por 1 a 0 no clássico contra o Flamengo. O Glorioso passou por momentos de grande pressão no primeiro tempo, mas segurou o placar, retomou a concentração e teve ótima atuação tática na segunda etapa. Quando a organização defensiva da equipe não frustrou o ataque rubro-negro, Gatito apareceu para salvar.


Luís Castro promoveu mudanças para disputar o clássico. A entrada de Tchê Tchê e Lucas Fernandes, nos lugares de Patrick de Paula e Chay, mostrou a preocupação do treinador com a intensidade do meio-campo alvinegro. Intensidade aqui não deve ser confundida com correria, mas entendida como o controle de dinâmicas de posicionamento e movimentação com e sem a bola, o que permite que a equipe seja capaz de dar velocidade à bola na troca de passes e pressionar o adversário para retomar a posse. A trinca de meias, formada também por Oyama, buscou preencher melhor o setor e gerar aproximações para facilitar a criação de linhas de passe.


O posicionamento do trio deu o tom da dinâmica pretendida por Castro. Lucas Fernandes ora recuava como um meia interior para melhorar a circulação da bola no meio-campo alvinegro, ora ocupava espaços mais avançados para explorar situações de superioridade numérica contra defesa adversária. A ideia funcionou nos minutos iniciais, quando o Botafogo conseguiu ter mais posse e impor seu estilo de jogo. Daniel Borges apareceu como a melhor alternativa ofensiva com boas arrancadas e inversões de jogo. Mas não demorou para o Flamengo encaixar a marcação, subir a pressão no meio-campo e passar a controlar o jogo. Saravia levou um cartão amarelo aos nove minutos, tornando tensos todos os duelos com Bruno Henrique no lado direito da defesa alvinegra.


A pressão alta exercida pelo Flamengo matou a saída de bola do Botafogo. Por duas vezes, Oyama foi desarmado na entrada da área, gerando ocasiões de perigo para o adversário. Ao todo, o time teve 19 perdas de posse de bola na primeira etapa. Enquanto o Flamengo foi para o intervalo com 11 desarmes, o Botafogo conseguiu apenas três. A verticalidade do jogo rubro-negro aliada às infiltrações de Gabriel começaram a ameaçar o gol defendido por Gatito. Aos 24, Cuesta salvou o que seria o primeiro gol do atacante. Dois minutos depois, nova jogada de infiltração e bola na rede, anulada apenas por impedimento apontado pelo VAR.


Vendo o time sem saída de bola e amplamente dominado pelo adversário, Luís Castro mexeu no time aos 27 minutos. Colocou Diego Gonçalves no lugar de Gustavo Sauer e deslocou Victor Sá para o lado direito. Ao posicionar um destro na ponta-direita, o treinador buscou mais profundidade no setor, com um jogador buscando a linha de fundo a todo momento. A presença de um ponta agudo também procurou segurar os avanços do lateral Ayrton Lucas, diminuindo a presença ofensiva do Flamengo no corredor no qual era mais perigoso. A mudança surtiu efeito e o Glorioso foi capaz de reequilibrar o jogo e voltar a criar ocasiões de gol com Erison e Victor Sá.


O Botafogo terminou o primeiro tempo com 58% de posse de bola, mas com um índice de acerto nos passes de 87%, abaixo da média no campeonato. A falta de espaços provocada pela intensidade da marcação adversária, concentrou a posse alvinegra em seu próprio campo, distante do gol. A alternativa mais clara para escapar da pressão do Flamengo parecia o jogo direto, apostando em passes mais verticais aproveitando o espaço que o adversário cede às costas de sua linha defensiva. Mas outro dado da primeira etapa mostra a dificuldade da equipe para ser eficaz também neste sentido: das 14 tentativas de lançamento, apenas três foram bem sucedidas.


Algumas jogadas do primeiro tempo evidenciaram erros técnicos individuais que prejudicam a fluidez do jogo alvinegro. Daniel Borges e Diego Gonçalves mostraram dificuldade em usar a perna esquerda para cruzar, o que tira a velocidade e os torna previsíveis para o marcador. Lucas Fernandes e Erison “furaram” em lances que poderiam terminar em finalizações perigosas. Contudo, é coletiva a deficiência que causa mais dificuldades ao Botafogo. O time ainda não é capaz de pressionar de forma coordenada a posse de bola adversária. Assim, o jogador com a bola tem muito tempo para escolher a melhor jogada e os demais têm facilidade em encontrar espaços nos deslocamentos.


Na volta do intervalo, o Botafogo não trouxe substituições, mas mudou a postura. A principal alteração foi no nível de concentração na execução dos fundamentos. O time voltou mais ligado e consciente de seu plano de jogo. Logo aos cinco minutos, depois de um lançamento de Cuesta, Diego Gonçalves conseguiu espaço para progredir. Rapidamente, tocou para Erison, explorando a melhor característica do centroavante, a força no arranque para ganhar o um contra um. El Toro cortou a marcação de David Luiz, soltou a perna esquerda na bola e marcou seu 11º gol na temporada. O destaque na jogada foi a verticalidade que o time foi capaz de imprimir, acertando os passes e aproveitando os recorrentes erros na transição defensiva do adversário.



Aos 31 minutos do segundo tempo, Lucas Fernandes e Erison deixaram o campo para as entradas de Del Piage e Matheus Nascimento. O Botafogo se defendeu em um 4-1-4-1 em bastante compacto que frustrou as investidas do ataque rubro-negro. Jogando entre as linhas de marcação, Oyama cresceu no jogo, conseguindo importantes antecipações para retomar a posse e distribuir a bola com qualidade. Victor Sá também fez um segundo tempo de muita entrega tática. O ponta apareceu menos no campo de ataque, mas foi fundamental para tirar espaços e limitar as ações de Bruno Henrique no lado direito da defesa alvinegra.




O Botafogo contou com a melhor exibição de Gatito desde o seu retorno para vencer o jogo. Mas o grande trunfo no segundo tempo foi ser um time sólido, que deixou de oferecer espaços e complicou o jogo para o Flamengo. Em um momento de grande exigência técnica, física e psicológica, a equipe mostrou organização. Jogadores cientes de suas funções individuais e do seu papel para o funcionamento coletivo. Poucas ações aleatórias são vistas no jogo alvinegro. Com o avançar do trabalho de Castro, os padrões de jogo vão ficando mais claros e a individualidade e o improviso passam a ser recurso para gerar desequilíbrios, não mais a única alternativa de jogo.



O Botafogo volta agora a mirar os esforços para a Copa do Brasil. Na quinta-feira (12), às 21h30, o Glorioso recebe o Ceilândia no Nilton Santos para selar a classificação para a próxima fase.


Números do jogo: (Footstats)

Posse de bola – BOT 53% x 47% FLA

Passes certos – BOT 300 (86%) x 351 (88%) FLA

Finalizações – BOT 12 (6 no gol) x 18 (9) FLA

Assistências para finalização – BOT 8 x 15 FLA

Desarmes – BOT 9 x 21 FLA

Interceptações – BOT 8 x 7 FLA

Rebatidas – BOT 34 x 28 FLA

Cruzamentos – BOT 2/11 (18%) x 6/28 (21%) FLA

Lançamentos – BOT 9/33 (27%) x 6/17 (35%) FLA

Viradas de jogo – BOT 4 x 1 FLA

Dribles – BOT 2 x 7 FLA

Perdas de posse de bola – BOT 37 x 23 FLA

Faltas – BOT 18 x 13 FLA

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